quarta-feira, 21 de março de 2018

Da música clássica às trilhas sonoras cinematográficas: um novo capítulo para a Orquestra Sinfônica da UFRN

                                        Da esquerda à direita: maestro assistente Erickinon Bezerra,
                              maestro André Muiz e João Batista. Foto: Equipe CP.




“Cordas, por favor, compasso 184”. Farfalhar de folhas. O maestro levanta a batuta, respira fundo, diz mais alguns aperfeiçoamentos e, com a firmeza de quem já faz isso há muito tempo, inicia a peça. Os sons dominam o ambiente, a música enche o auditório vazio, reverberando na madeira das paredes. Num segundo, a Orquestra não é mais um conjunto de músicos, mas sim um organismo vivo, trabalhando como um só.

Para nós que assistimos ao ensaio, tudo já parece perfeito. O ritmo, a sincronia das notas, a sequências dos compassos. À nossa frente, o maestro da Orquestra Sinfônica da Escola de Música da Universidade do Rio Grande do Norte, André Muniz, move o corpo com força e determinação. A única luz acesa no palco ilumina o palanque onde ele se encontra. A luz amarela deve ser quente, mas André não parece se importar. É o penúltimo ensaio antes do espetáculo que acontecerá na noite de sábado, 17 de março.

Do Poderoso Chefão a Harry Potter – Sinfônica da UFRN nas Trilhas do Cinema é o primeiro concerto do ano, estreando a nova seleção de músicos selecionados apenas algumas semanas antes. A apresentação é um compilado das principais trilhas sonoras do cinema mundial, trazendo principalmente as composições do premiado maestro e compositor John Williams. Na lista de filmes temos Indiana Jones, Harry Potter, A Lista de Schindler, Star Wars e outros sucessos.

Produtor e diretor administrativo da OSUFRN, João Batista conta que a ideia para o espetáculo surgiu numa das reuniões de segunda-feira. De início, a proposta era trazer algo novo e grandioso, ainda não realizado por ela. O maestro sugeriu as trilhas sonoras feitas por John Williams e daí foi desenvolvido o resto do concerto. Para criar a experiência completa, eles decidiram montar uma apresentação que unisse música e cena. Atrás do palco, haveria um telão que passaria as cenas dos filmes enquanto a Orquestra se concentrava na música. “É importante que contextualizar sempre cada obra, mostrar aos músicos que não é só para tocar mas também para sentir”, endossou João.

O conjunto é um desafio para os musicistas que ensaiam apenas há duas semanas. Os dedos, tão ágeis pelas cordas, teclas, chaves, repetem os mesmos movimentos todos os dias, buscando a perfeição - ou pelo menos o que há de mais próximo a ela. André explica que em termos técnicos, as peças dos filmes não são muitos diferentes das músicas clássicas tradicionais, frutos de grandes artistas como Mozart ou Beethoven.

“A gente retomou a Orquestra há algumas semanas. Foi duro, pois canções como do Harry Potter são muito difíceis. E fazer isso em poucos dias foi um desafio. Mas ao mesmo tempo é muito bom porque essa Orquestra é um laboratório para a Universidade”, afirma. No entanto, ao analisar o ambiente, ele acrescenta que, devido à temática do concerto, os músicos estão mais relaxados e o clima dos ensaios mais ameno.


Os estudantes que integram a Orquestra também sentem o ambiente mais leve, mais convidativo. “Eu adoro Star Wars e para mim é bem gratificante tocar. A gente fica até mais instigado a tocar quando toca uma coisa que a gente gosta. Eu fico dividida entre querer assistir e querer tocar, porque você tocando é uma coisa e por fora, você assistindo, é outra”, conta Andresa Laíze, contrabaixista.

É quase difícil acreditar, ao olharmos o palco, que lá estejam 56 músicos. O espaço é pequeno e apertado, mal cabem os alunos, os instrumentos e o palco do maestro. Os canhões de luz, responsáveis pela ambientação, também dividem espaço com eles. Um dos violoncelistas brinca ao descer do palco, “a luz estava encadeando nos meus óculos”. André Luiz ri, mas pede a um dos técnicos que movam o canhão de lugar.

 Não foi o primeiro pedido de ajustes – durante todo o ensaio, o maestro ditava alterações e recriava mais uma vez o ambiente do concerto. No intervalo entre a primeira peça ensaiada e segunda, ele conversa com um dos professores em espanhol, ainda sugerindo mudanças na iluminação. André também presta atenção detalhadamente na sequência de imagens à sua frente, para que não perca sincronismo com a música. Ele admite que tudo aquilo é novidade para ele e que por isso não consegue relaxar cem por cento. “É uma realidade com a qual eu não estou acostumado, eu estou aprendendo junto com eles. Sincronizar a música com a imagem do telão, são tempos muito próximos, então não posso perder a atenção. Eu me divirto, óbvio, mas é uma diversão bem contida”.

Dedicação e paciência que levam a um belo espetáculo, de casa cheia. Às cinco horas da tarde do sábado, a Escola de Música da UFRN já está lotada. Os ingressos das duas sessões, vendidos durante a semana, esgotaram em quarenta minutos. Há quem tentou conseguir ingressos de última hora ou se espremer nos bastidores, mas tudo estava lotado. No hall da recepção, um telão transmitia simultaneamente tudo o que se passava dentro do auditório para aqueles que não podiam estar lá dentro.

Para a equipe da Orquestra, o sucesso inesperado é um sinal de que as pessoas estão se interessando mais pela produção cultural do estado. João Batista, também ex-secretário da cultura do município de Carnaúba dos Dantas, alega que faltam governantes que invistam na produção cultural do Brasil. “Ter acesso à cultura não é só assistir um espetáculo. O acesso à cultura é trabalhar as políticas públicas, com todos os artistas, com todas as áreas culturais. Muitos gestores pensam que evento é cultura, mas não, isso (aponta para o palco) é cultura”, declara.

Fonte: Caderno de Pauta

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